segunda-feira, 13 de abril de 2009

O direito de dormir

Ítalo Stephan. Publicado no jornal Tribuna Livre em 09/04/2009

Quase todo o mundo que trabalha o dia inteiro, a semana inteira quer e precisa ter suas merecidas horas de descanso, à noite e nos finais de semana. Em Viçosa este direito está cada vez mais difícil de ser usufruído. Há, durante as noites muito barulho que perturba e transforma os sonhos em mau humor e cansaço.
Observando o Código de Posturas de Viçosa (Lei 1.574/2003), fica claro que há negligência do poder público e inúmeras infrações:
Art. 132 – O Município assegurará a ordem, o decoro e o sossego públicos.
Art. 136 – É proibida a emissão de ruído, como tal entendido o som puro ou mistura de sons, capaz de prejudicar a saúde e o sossego públicos.
Art. 131 – Por motivo de conveniência pública, poderão funcionar em horários especiais os seguintes estabelecimentos: VIII – restaurantes e bares: nos dias úteis, domingos e feriados de 7 às 2 horas da manhã.
Art. 139 – Independentemente da medição do nível sonoro, são proibidos os ruídos: I – produzidos por veículos com equipamentos de descarga abertos ou silencioso adulterado ou defeituoso; e III – decorrentes de qualquer atividade que produza ruído caracterizando flagrante incômodo à comunidade circundante, antes das 7 (sete) horas e depois das 19 (dezenove) horas, nas proximidades de escolas, hospitais, asilos, orfanatos e congêneres e antes das 7 (sete) horas e depois das 22 (vinte e duas) horas nas proximidades de residências.
Cães nervosos latem enquanto os acostumados donos já não são perturbados. Mas esse é um dos problemas menores. Os causadores dos desagradáveis incômodos noturnos são seres de uma raça conhecida como racional e social, formada por homens e mulheres. Há, espalhado por toda a cidade exemplos de total falta de respeito: sapateados na laje do apartamento de cima, barulhos provocados pelos irritantes roncos dos motores de motocicletas e automóveis; portas fechadas com violência; freadas e aceleradas de veículos de canos furados ou deliberadamente preparados para marcar presença pela falta de educação. Espalha-se pela cidade, principalmente na área central, o péssimo costume de ocupar calçadas e praças, sem deixar passagem, com mesas e cadeiras espalhadas por donos de bares. Esse hábito, além de desrespeitoso com os espaços públicos e que deixa a cidade suja, tem transformado áreas da cidade em locais em que o direito de dormir e descansar desapareceu. Espalham-se nas cidades as festas que avançam noite adentro fazendo com que, grosseiramente dizendo e ao mesmo tempo pedindo desculpas, nossos ouvidos funcionem como penico. Gente falando e gritando alto e música de letras vulgares estourando as caixas de som até altas horas, todos os dias da semana, mostram o que há de pior em termos de viver em sociedade.
Com tanto barulho, os latidos dos cães deixam até de ser percebidos. Fica, principalmente à noite, um “caldo” de ruídos, incômodo, produto da falta de educação de uns poucos. Muita gente acaba se acostumando na marra com esses incômodos, ou dormindo de exaustão. Há solução mais civilizada para isso? É claro! É possível conviver com barulho dentro de ambientes acusticamente tratados que impedem sua propagação para os vizinhos. É possível fazer festas com som mais baixo. É possível fazer a fiscalização ser rígida e eficiente. É possível ampliar e praticar políticas públicas voltadas para o esporte e a cultura, que dêem alternativas para as pessoas substituírem o álcool e as músicas de péssima qualidade por algo mais saudável e civilizado. É mais difícil, mas também possível, tornar as pessoas mais educadas, mesmo que seja sob ordem da polícia ou doendo no bolso.

Um comentário:

  1. A cidade é mesmo um caldo de vontades.

    O texto do Ítalo coloca mesmo um retrato do que conhecemos como cidade real e sugere possibilidades para o que conhecemos como cidade ideal. Sim, cada um de nós sabe exatamente quais são as duas cidades e é justamente dai que derivam dois dilemas imediatos: a cidade ideal o é para quem? Como lidar com a cidade ideal diante da cidade real? Participação, política e planejamento urbano. Será?

    Procurem ouvir a música "A cidade ideal" de Enriquez, Bardotti e Chico Buarque.

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