domingo, 16 de novembro de 2014

CHOVER NO MOLHADO

Texto publicado no jornal Tribuna Livre, em Viçosa-MG, em 12/11/2014

 

Embora a frase do título não faça nenhum sentido durante uma época de seca inédita, nunca é demais falar sobre a crise da água pela qual passa o país e, com  um olhar local, pela qual passa Viçosa. Nunca é demais manter o alerta, pois é um assunto de décadas, já levantado por vários especialistas no assunto: na década de 1990, por grupos criados como o S.O.S. São Bartolomeu (1994); pelos processos participativos do Plano Diretor de Viçosa (1998-2000 e 2007-2008); pelo Plano de Saneamento Básico (2010-2011); pela rejeição em 2012 da criação da Zona Residencial do Paraíso e pelo início dos trabalhos da criação da Área de Proteção Ambiental do São Bartolomeu, no mesmo ano, mas que ainda não tem uma conclusão prevista.

Enquanto tudo isso acontecia, na bacia do Ribeirãozinho São Bartolomeu, que abastece a UFV e parte da cidade, o processo de ocupação, o qual surgiu e continua altamente prejudicial à bacia. Construiu-se, como nunca, nas áreas de proteção permanente, com ou sem anuência do Poder Executivo.

Nos últimos dias, debates em programas de rádio e TV, notícias em jornais e na Internet, levantaram-se questões  como a falta de leis e a falta de fiscalização. A  primeira não é correta, pois temos, há tempos, as leis federais insistentemente  ignoradas (Código Florestal e 1965 e o de 2012, a Lei de Parcelamento do Solo, de 1979) e as municipais ( Lei Orgânica de 1989, o Plano Diretor, as Lei de Parcelamento e Uso do solo urbano, os novos Códigos de Obras e Ambiental (elaborados em 2000 e aprovados em poucos anos depois). Temos um Codema que age(?) timidamente e um Complan (Conselho Municipal de Planejamento) inativo há anos. O IPLAM foi criado em 2000, para planejar e fiscalizar, mas se recusa a atuar mesmo sob denúncias de construção de loteamentos irregulares, inclusive os dentro da área urbana e da bacia do ribeirão (tem deles no Palmital, no Marrecos, no Deserto, no Paraíso e ao lado do Romão dos Reis). O órgão usa o argumento equivocado de que não pode atuar e autuar em área rural. Por onde anda o IEF, que não viu a destruição de nascentes, a derrubada de árvores, a construção nas áreas de preservação permanente? Onde estava o SAAE que não aplicou os recursos para medidas mitigadoras e de produção de água?

Enquanto isso, parte dos moradores são conscientes dos problemas, praticantes corretos do uso da terra e estão muito preocupados. Alguns não denunciam por medo. Outra parte dos proprietários vislumbra a garantia de um patrimônio para seus descendentes com a subdivisão ilegal do solo e com a construção irregular. Uma outra parte que depende da terra, usa mal a água produzida, com técnicas inadequadas de irrigação e manejo do solo, com desperdício do cada vez mais precioso líquido. A assistência técnica da prefeitura e a da excelente UFV não parecem impedir o agravamento da situação. Não se veem boas práticas na região.

Porque as coisas não funcionam, no entanto, têm uma causa mais cruel: é a total falta de vontade política, que predomina há décadas, de agir no que é necessário, de impedir a deterioração ambiental e de proibir as muitas agressões ao ambiente. Trata-se de irresponsabilidade, negligência, improbidade de quem deveria comandar. Isso tem de mudar. O atual momento de escassez só deixa essas arestas mais visíveis. O provável retorno das chuvas não poderá esconder mais isso.

Um comentário:

  1. Com a nova mudança na prefeitura tentando fazer com que o Iplam volte a ser um órgão de planejamento, quem sabe não contratem novos funcionários p tomar as devidas providências tb na zona rural. Não custa nada continuar chovendo no molhado, talvez assim a prefeitura de o devido valor p o Iplam .

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