Artigo publicado no jornal Tribuna Livre de 03 de abril de 2014.
Bruegel - Gula
Ao final do churrasco de formatura da UFV, na segunda semana de março, havia um tapete de lixo no lindo Recanto das Cigarras. Era um lixo composto por milhares de pratos, copos e garfos plásticos, guardanapos e espetos de bambu; uma boa parte com pedaços de carne. Nas mesas, nos bancos, nas bases das árvores, nas muretas sobravam pratos com restos de guarnições. Centenas de quilos de desperdício. Um quadro lamentável, em se tratando de um público com educação universitária. Um nojo, uma vergonha, algo abominável!
Ao final do churrasco de formatura, vários participantes desfilavam com as mãos cheias de espetos de churrasco crus, levados para casa para fazer mais festas patrocinadas pelos contribuintes pais de formandos. Junto com os espetos, iam fardos de cerveja que não era das mais baratas. O tempo bom, a sujeira e o barulho infernal, o churrasco pode ter sido um sucesso para muitos. Mas o que ficou de imundície e desperdício é sinal de que há algo de podre no reino de fantasia dos formandos, que parece sugerir que detalhes assim são descartáveis, frente às comemorações. Afinal nosso país é rico e desenvolvido, não é mesmo? Quais são os limites desses fartos festejos?
Entre o lixo, várias 'dolinhas' (preservativos), garrafas PET, embalagens e palitos de picolé, papel higiênico, tampinhas, anéis de cerveja, fichas (do churrasco dos formandos), papéis de bala, centenas de bitucas de cigarro... outros lixos variados: calotas de carro, latas de cerveja, copos de milk shake...
Sinto, infelizmente, no ar, algo de podre rondando uma estrutura de um grande negócio que é a organização das festividades de formatura. Tal estrutura movimenta centenas de milhares de reais e é feita por meio de licitações regadas a muitas regalias e vantagens para os organizadores e para as empresas que organizam o megaevento de uma formatura na UFV. Espero que não haja, por baixo do tapete da organização desses eventos um lixo muito maior e mais fedorento que aquele que resta dos churrascos de formatura. O processo exclui a maior parte dos formandos, aos poucos os homenageados, e até mesmo os parentes que gostariam de dividir o momento tão importante. A UFV entra com uma maravilhosa estrutura física, mas fica em franca desvantagem, é usada para que alguns se deem bem. Isso acontece ano após ano.
Sou a favor de comemorar, e muito, a vitória cheia de dificuldades, a trajetória, a formação dos estudantes. Pode ter baile, churrasco, abraços, música, aula da saudade, fotos mil. Isso os alunos merecem, mas tudo tem limites e o que vem acontecendo já os ultrapassou de longe. As abastadas solenidades excluem a maioria das pessoas que deveriam estar juntas comemorando tão importante momento. Até quando nós vamos ficar fingindo que está tudo bem? Não, não está tudo bem! Eu não compartilho e não concordo com isso. Parece que falta ética na organização, ouço histórias de corrupção e obtenção de vantagens pessoais, algo que deveria ser fiscalizado e averiguado. Visível, escancarado mesmo é o desperdício, a falta de educação com a coisa pública, a falta de reconhecimento por parte de alguns estudantes. Não é isso que ensinamos aqui, mas parece que sim, ou é, no mínimo, uma lamentável omissão da Academia. Há muita coisa a ser mudada, há muito a ser discutido. O modelo baseado no esbanjamento, na esnobação, na exagerada valorização material se esgotou.
Segunda foto:
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