sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Leis e salsichas

A Rua Nova e o terreno à direita, local das futuras torres gêmeas













"Leis são como salsichas; é melhor não saber como são feitas".
Otto Von Bismarck (1815-1898)

Mais um caso absurdo de abuso do poder econômico aliado ao político atropelando o meio ambiente e o planejamento urbano. Divulga-se a construção de duas torres de apartamentos em um terreno localizado ao lado da localidade conhecida como Rua Nova. Uma ardilosa estratégia legislativa torna o projeto possível. Uma alteração de texto para mudar uma lei alterou também a lei de zoneamento.

Pela Lei 1420 (Zoneamento e Uso do Solo) original a área do lado do Acamari é uma ZR4 e a do lado da Rua Nova ZR3 - Zona Residencial 3 – que tem como características a predominância de uso residencial e restrição à verticalização, sendo permitido instalar indústrias de até médio porte ou do tipo toleradas. Para efeito de novos parcelamentos, são exigências para os lotes da ZR3 terem área mínima de 360m2 e testada mínima de 12m. O Coeficiente de Aproveitamento máximo de 1,5 (pode-se construir uma vez e meia a área do terreno). A Taxa de Ocupação máxima de 50% (pode-se ocupar a metade do terreno com construção) e a Taxa de Permeabilização mínima de 30% da área do terreno.

A Lei 1848/2007 denominou de Avenida Prefeito Geraldo Eustáquio Reis o trecho entre a Rua Carmita Pacheco e o término do trevo que dá acesso ao Bairro Acamari. Em 2008, a Lei 1865/2008 a substitui esticando a avenida até o trevo de acesso ao bairro Romão dos Reis e a inclui como Corredor Secundário no anexo V da Lei 1420/2000. Isso significa que o que era ZR3, agora como corredor passa a ter como características a predominância de uso comercial e ser área adensável, sendo permitido instalar indústrias de médio porte, não incômodas. O Coeficiente de Aproveitamento máximo passa para 2,8. Sua Taxa de Ocupação máxima de 80% para os dois primeiros pavimentos, desde que para uso comercial e/ou garagem, e de 60% para os demais pavimentos; e a Taxa de Permeabilização mínima de 10% . Por fim, o gabarito máximo das edificações passa a ser de 10 pavimentos.

Há algumas questões a serem respondidas uma vez que tamanha esperteza na aprovação de uma alteração de lei passou a confrontar com o Plano Diretor.

Como é que uma alteração dessa sutileza e de conseqüências danosas ao meio ambiente passou se que o IPLAM, o SAAE, o Complan e o Codema fossem consultados?

Como é que ninguém interessado no meio ambiente e no planejamento viu tamanha aberração?

Como é que, enquanto a revisão do Plano Diretor descansa na Câmara, alguns edis aprovam uma bizarrice dessas?

Quais foram as justificativas para transformar uma área de baixa densidade demográfica em mais um foco de verticalização?

O simples fato de incluir de forma mal-intencionada um nome de via dentro de uma categoria não faz com que o trecho da Avenida adquira as características de um corredor. Imagine o impacto de uma área que passa a poder receber comércio de grande porte, possa ter construído prédios de dez pavimentos e impermeabilizar o solo em uma área que deveria ser preservada como a do manancial mais importante de Viçosa?

Tudo isso para aprovar um projeto de duas torres de apartamentos de dez pavimentos. O IPLAM aguarda parecer de um relatório de impacto ambiental, mas não consulta o insepulto Complan. Cadê a posição do CODEMA? Promotores públicos, quais são as suas opiniões? Cidadãos, o que é que isso tem a ver com vocês? Senhoes vereadores, porque não revogam essa lei?

Um comentário:

  1. Parabéns pelo blog Ítalo.
    Os textos estão muito bons e é muito importante manter viva a discussão dos problemas das nossas cidades!
    Saudades de Viçosa, da UFV, do DAU e de todos os professores e colaboradores.
    Um abraço,
    Lívia ( ex-aluna turma de 2002)

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