Artigo publicado em 06/01/2022, no jornal Folha da Mata, Viçosa-MG.
Recentemente, foi realizada uma Audiência Pública sobre o atendimento nos hospitais em Viçosa. São atendimentos tão precários que chegam a ser desumanos. Tudo bem que muitos pacientes pulam a etapa de procurar os centros de saúde, que também ficam superlotados, mas o que ocorre depois das dezoito horas e aos fins de semana é preocupante, é triste, é lamentável.
Há uns dias, no final da tarde, tropecei, caí e machuquei o tornozelo. Liguei para o consultório de um médico, mas não consegui vaga. Decidimos, eu e minha esposa procurar um hospital. Perguntei à atendente qual hospital procurar. Ela informou que qualquer um dos dois. Decidimos ir ao Hospital São Sebastião. Na recepção, fomos informados de que não havia ortopedista e que o aparelho de raios-x estava quebrado. Fomos orientados a procurar o Hospital São João Batista. Ao chegarmos lá, na recepção, disseram-nos para procurar o Hospital São Sebastião. Retruquei dizendo que lá nos mandaram para cá. A atendente reclamou que isso estava sobrecarregando o atendimento. Mandou-nos para uma sala lateral do hospital para fazer a ficha.
Na entrada da sala, já havia umas dez pessoas aguardando atendimento. Na recepção, havia uma ala lateral com bancos com cerca de umas oito pessoas, em frente outro banco com mais três. Atrás do banco uma pessoa numa cadeira de rodas, duas macas com pessoas deitadas. Em frente à recepção há um consultório e uma sala de medicação. Da recepção, podia-se ver que nessa sala havia umas camas com algumas pessoas deitadas, gente sentada recebendo medicação dos enfermeiros. Era muita gente em pé e alguns pacientes sequer usavam máscara.
Ficamos no hospital com meu tornozelo inchado e doendo, aguardamos por cerca de três horas e meia sem eu ser atendido. Desistimos, cansamos de esperar, fomos embora para casa para eu ser atendido por um ortopedista no dia seguinte, pois, privilegiado que sou, tenho um plano de saúde. Durante o tempo que ficamos ali, vi a escassez de médicos, vi o enorme, o incansável esforço dos enfermeiros que lá estavam. Vi muita gente circulando em uma área muito pequena. Vi gente mais velha que eu acompanhada por esposa, filha e filho (será que precisava tanta gente?). Soube, de uma sobrinha de um senhor com o pulso aberto aguardando há horas. Ouvi vários nomes serem chamados, sem resposta, e percebi que desistiram de esperar. Vi uma mãe com um menino de uns dois anos, a criança com conjuntivite, que aguardava há horas apenas para trocar a receita de um medicamento não encontrado nas farmácias. Lentamente, chamavam algumas pessoas com feridas expostas, para a sala de raios-X. Em frente a todos, passaram com uma maca com uma pessoa com o corpo todo coberto, saído da sala de medicação.
Não sei como teria sido se meu ferimento fosse mais grave e se não tivesse outra alternativa a não ser passar pela humilhante condição comum a todos. Participei, por apenas algumas horas, do drama da precariedade do atendimento à saúde em Viçosa, o que não é diferente de tantas outras cidades do país. Presenciamos a triste forma de como as pessoas se acostumam com o sofrimento, aglomeram–se e se acomodam pacientemente com o que a elas cabe; como toleram, sem alternativa, as indignas condições. Espero com certo ceticismo que a Audiência Pública resulte em algo concreto. O atendimento à saúde é uma longeva, até então, imortal doença crônica, uma pandemia lenta e inextinguível.
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