domingo, 2 de fevereiro de 2020

CHUVAS, RIOS E CIDADES



Este é um texto publicado em 2012 no jornal Tribuna Livre (Viçosa-MG), requentado agora, mas continua e continuará atual.

É um dos textos publicados no meu livro "Fábulas urbanas e outras lições sobre as cidades", de 2019.

Foi publicado no jornal Folha da Mata em 30/1/2020.

Há quem diga que o mais importante não é o que comemos entre o Natal e o Ano Novo, e sim o que comemos entre o Ano Novo e o Natal. Se fizermos uma comparação, o que se faz nos períodos chuvosos não é o mais importante e sim o que é feito - ou que deveria ser feito - entre os períodos chuvosos, durante muitos anos e com muitas obras e fiscalização efetiva. Ou seja, sem planejamento sério e sem mudança de paradigmas, fica difícil enfrentar tantos problemas e tanto sofrimento.

É claro que São Pedro anda pegando pesado (novamente) na Zona da Mata mineira, assim como o fez anteriormente na Serra de Petrópolis; em São Luiz do Paraitinga (SP); em Santa Catarina, assim como vai continuar em outros locais. Mas a maior parte do que vemos é consequência de ocupação indevida feita, há décadas, e permitida nas margens dos rios nas cidades. Se o Código Florestal de 1965 fosse obedecido, as faixas marginais deveriam ser de no mínimo 100 metros para rios com mais de 50 metros de largura (como deveria ter sido feito em Guaraciaba, Ponte Nova e Cataguases). Nos rios menores, 50 metros de faixa de preservação (como em Piranga,  Senador Firmino ou Ubá) bastariam para evitar muitos problemas. Quanta coisa se deixou construir dentro dessas faixas! O que os rios fazem é reclamar seus leitos. O custo disto é muito alto e muito triste. Todo ano é a mesma coisa. As ocupações das encostas íngremes e cortes de terra produzindo barrancos instáveis são outros fatores graves, mas absolutamente corriqueiros nas cidades da Zona da Mata. É mais desobediência às leis federais como a Lei 6.766 de 1979 (Parcelamento do Solo Urbano) e às muitas leis municipais de controle do uso e ocupação do solo urbano. Ë o preparo contínuo para mais desastres, como o que ocorreu em Ouro Preto ou Friburgo.

Não podemos deixar de elogiar o trabalho da Defesa Civil, que alerta, notifica, sugere medidas, mas seu papel esbarra no não cumprimento por parte dos proprietários e, às vezes, da própria administração municipal. Parece que há muito dinheiro federal para isso, mas este não chega por causa da falta de projetos bem feitos, por questões políticas e por aproveitadores criminosos.
Medidas paliativas são apenas medidas paliativas. Promessas de obras feitas nesta época são meras palavras vazias. Ë só ver os valores prometidos e comparar com o que efetivamente chegou para ajudar na serra de Petrópolis. É preciso reverter a lógica absurda em que se “gasta” quase dez vezes mais no conserto de estragos que na sua prevenção. Deve-se achar e punir os bandidos que enriquecem em cima de enormes dramas. É preciso dragar rios, fazer obras de engenharia; fazer cumprir a legislação ambiental; educar a população e treinar os moradores para estes saberem como agir em casos de riscos.  Daqui para frente, dever-se-ia construir o que a técnica, a lei e o bom senso pedem há décadas. As nossas cidades são insustentáveis nesses quesitos básicos. Se quisermos mudar o destino de muitas novas calamidades, temos de mudar nossa maneira de continuar erguendo as cidades.


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