13 setembro 2020

ASFALTO, MEU AMOR!

 Artigo publicado no jornal Folha da Mata, Viçosa-MG, 10/09/2020.

Por que os prefeitos, especialmente nos meses que antecedem as eleições, gostam tanto de asfalto? Por que as pessoas gostam tanto de asfalto? Em meio aos sinais de crise hídrica e às práticas que vão na contramão da sustentabilidade, ainda persiste entre nós a mentalidade míope de que o asfalto deve ser aplicado indiscriminadamente nas cidades. Em Qualquerlândia, o prefeito anuncia o asfaltamento em bairros populosos, às vezes com a substituição de blocos sextavados por asfalto. Nesse período eleitoral o prefeito anuncia o maior programa municipal de recuperação de vias urbanas dos últimos tempos em nossa cidade.

Os moradores, em sua maioria, adoram e cobram da prefeitura esta solução. No entanto, a prefeitura retira a solução mais adequada, por ser mais permeável, que o asfalto. O problema não é bloco de concreto. Os blocos são menos quentes que o asfalto e permitem consertos nas redes de água, esgotos e pluviais sem maiores problemas. Os blocos de concreto são mais permeáveis esteticamente bonitos. Os remendos no asfalto sempre são problemáticos, os em blocos são de fácil recomposição. A nova pavimentação com asfalto impermeabiliza ainda mais o solo, o que incide na descarga mais rápida das águas pluviais para os acanhados e sofridos córregos, além de diminuir a absorção da água até os lençóis freáticos, que alimentam nossos mananciais.

Um dos principais defeitos da pavimentação surge quando sua base é mal executada. Uma base malfeita terá o assentamento dos blocos com problemas ou um asfalto com problemas. O asfalto se deteriora mais facilmente e precisa ser retirado com frequência, em geral a cada quatro anos (mera coincidência?). Os blocos de concreto ficam intactos. Além disso, é o único tipo de pavimento que não pode ser encarado como um gasto e sim como ativo fixo, uma vez que não se deteriora com o uso. Os blocos podem ser facilmente moldados, aplicados e reaplicados.

É comum, aqui em Qualquerlândia acontecer de serem retirados os blocos existentes para aplicá-los em bairros mais humildes. Curioso isso, não? Se os blocos não servem para os bairros ricos, por que servem aos mais pobres? Por que não corrigir os defeitos e cuidar de tantas outras prioridades básicas existentes em bairros carentes de infraestrutura?  O asfalto pode ser usado sim, em alguns tipos de vias que exigem trânsito rápido, desde cercado das devidas medidas de segurança.  O asfalto traz inicialmente um conforto maior para os motoristas e passageiros dos veículos, mas favorece mais velocidade para os automóveis e exige a quase imediata construção de quebra-molas.  O asfalto traz mais calor para os moradores e leva mais fuligem para as casas. A mudança provocará mais acidentes de trânsito e mais enxurradas.  Que vantagens são essas?

É muita irresponsabilidade quando se aplica asfalto em vias que não têm um sistema de drenagem, ou quando esse é insuficiente. Isso vem sendo feito em Qualquerlândia, mesmo à revelia da lei (mais uma das que não são obedecidas). Levar os blocos para pavimentar vias nos bairros mais pobres sem implantar antes o sistema de drenagem é inaceitável. O asfalto como moeda de troca por votos é exemplo de insustentabilidade ambiental. Asfalto usado indiscriminadamente é tolice O asfalto propicia uma enganadora visibilidade política. Asfalto é desejo de eleitor e é voto, mas é uma relação política ultrapassada. 


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