terça-feira, 2 de janeiro de 2024

ARTIGO: GENTE E BICHO


Artigo publicado no jornal Folha da mata, Viçosa,  em 28 de dezembro de 2023

Moramos numa cidade que não é muito grande, nem muito pequena. Nosso município faz parte do que chamam “Mar de Morros”, onde antes era tudo Mata Atlântica. Muito dela foi destruída, mas o nome ficou para designar a região: a Zona da Mata. Nossa cidade não para de crescer, só que de forma bastante desorganizada. Ela se expandiu, no início, ao longo dos vales, onde ainda esconde e espreme os leitos dos cursos d’água. Depois cresceu para o alto dos morros. Isso dizimou as matas ou o que já foram cafezais. Ficaram terrenos sujeitos à perigosa ação das chuvas. Aos poucos e de forma descuidada adentrou-se na área rural, modificando os usos; moldando espaços nem sempre adequados para lazer, festas, jardins; construindo piscinas, açudes. Esse crescimento impacta muito o meio ambiente e altera a vida dos animais e a forma com a qual convivemos com eles. 

Os animais das matas estão vivendo cada vez mais entre nós, ou melhor, nós adentramos continuamente em seus habitats. Tudo se misturou: urbano com rural, animais domésticos com animais silvestres, gente com bicho. No bairro onde moro, vejo, de manhãzinha e de tardinha, enormes bandos de garças acompanhando o vale do ribeirão. Isso é muito bonito e queria que isso acontecesse para sempre. Recebo visitas matutinas e vespertinas de um bando de galinhas d’angola, sei que gostam do meu quintal, porque lá não tem cachorro. Não é grande, mas tem várias árvores que servem de ponto de descanso e de observação para as aves. Recebo visitas de teiús enormes, gambás, tatus, jacus, araçaris, tucanos, maitacas, bem-te-vis, sabiás, galos do campo. Eles comem frutos que encontram no meu quintal: juçara, coco babão, jabuticaba, uvaia, pitanga. Antes aqui havia mais tatus, preás e corujas barranqueiras; agora ouço falar mais de pernilongos, escorpiões, cobras, baratas, cigarras, formigas cortadeiras e lagartas que acabam com nossos jardins e quintais. 

Meus vizinhos reclamam dos gatos que deixam excrementos em seus jardins e deixam loucos seus cães de estimação, enquanto outros vizinhos os alimentam às escondidas. Já vi na cidade muitos comedores, bebedores e casinhas para os cães de rua, que são muitos. De vez em quando aparecem cães com um tipo de blusa para aquecê-los no inverno. Essas são iniciativas legais. Infelizmente, por outro lado, há vários casos de maus tratos aos animais: filhotes de gatos jogados no rio; filhotes de cães abandonados em terrenos baldios; cães abandonados nas ruas, porque os donos não os querem mais; animais morrendo envenenados. Ah, quanta desumanidade!   Há, na cidade uma instituição privada de proteção dos animais que tenta, com muita dificuldade, abrigar essas pobres criaturas,pois depende de ajuda das pessoas e do poder público, só que o número de animais abandonados não para de aumentar. 

Os animais correm riscos com os humanos e nos deixam grandes problemas. De vez em quando, cavalos vão pastar nos jardins da praça central, ou, o que é perigoso demais, costumam ficar soltos nas estradas. Isso cria um risco constante de acidentes graves, mas ninguém impede isso de se repetir. No campus da Universidade ainda há capivaras, jacarés, micos e cobras. Seriemas já adotaram os jardins da UFV como lar. Há muitos cães abandonados que se tornaram agressivos.  Enfim, temos de cuidar dos animais, respeitá-los e desenvolver políticas públicas para lidar com essa questão. Nós devemos, gente e bicho, nos acostumar a conviver harmoniosamente, também é necessário controlar a expansão da cidade área rural adentro.  

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