21 abril 2024

CIDADE INJUSTA

Artigo publicado no jornal Folha da Mata, em 18 de abril de 2024.

 A cidade de Viçosa cresce de várias maneiras. A mais visível é com a verticalização, por meio da proliferação de edifícios de sete a doze pavimentos, nos bairros centrais (Centro, Ramos, Clélia Bernardes, Fátima, Lourdes, Santa Clara) e a eles periféricos, com edifícios de quatro a sete pavimentos (Santo Antônio, João Braz, Silvestre, Bom Jesus, Vau-açu). Chama atenção pela quantidade de prédios. Uma pessoa desatenta dirá que Viçosa parece uma cidade mais populosa. Há muitas cidades com mais de duzentos mil habitantes com muito menos prédios. Outra forma de crescimento danoso, quase silenciosa, é a dispersão urbana, com a multiplicação de parcelamentos de terra isolados nas bordas da cidade; quase sempre com apenas um acesso a uma via (isso é um problema), com grandes vazios urbanos supervalorizados, deixados entre eles.  Isso fica muito visível nos condomínios fechados (Acamari, Monteverde, Otávio Pacheco, Reserva Real, Caminho dos Lagos, Canto dos Sonhos etc.) e nos chacreamentos (Cantagalo, Cristais, Araújos, Retiro da Mata, Paraíso, Canela, Marreco, Chácaras Sauá etc.). 

Um dos empreendimentos mais recentes é o Vale Real, um conjunto de 95 lotes grandes, próximo ao bairro Romão dos Reis, numa encosta que divide a umas centenas de metros, com Nova Viçosa e Bom Jesus. Há um aspecto em desacordo com a legislação municipal. A Lei nº 1469/2001, de Parcelamento do Solo do Município de Viçosa, deixa claro, no Art. 10, que “os lados dos quarteirões não podem ter extensão superior a 200 metros de testada de lotes contíguos. Há, no condomínio dois trechos de vias que infringem esta norma: um de 550 metros e outro de 370 metros. Outro ponto que chama atenção é que, do ponto de ônibus do Romão dos Reis até a portaria do condomínio, há um estreito e sinuoso trecho de 700 metros em terra. A mesma lei determina que a Prefeitura “não aprovará loteamento cuja realização exija a execução, por parte do poder público, de obras e serviços de infraestrutura, inclusive de vias de acesso nas áreas adjacentes, salvo se tais obras e serviços forem executados às custas, pelo loteador”. Vamos aguardar se isso realmente vai acontecer, pois há precedentes em que recai sobre o dinheiro público a execução dessas obras; e um deles foi o asfaltamento e a construção de calçadas na “Nova” P. H. Rolfs, uma região destinada apenas às classes de maior renda.  

Não se pode negar que a verticalização excessiva sobrecarrega a infraestrutura (capacidade de suporte das redes de água, de esgotos e do sistema viário), impermeabiliza o solo gerando problemas de drenagem. Por outro lado, a dispersão excessiva impacta fortemente o meio ambiente com desmatamentos, amplos movimentos de terra; cria vazios urbanos valorizados, fomentando a especulação imobiliária. A dispersão também demanda o acesso aos serviços públicos (pavimentação, iluminação, coleta de lixo, transporte coletivo), quase sempre atendida para a população com mais alta renda. Esses dois fenômenos impossibilitam que nos bairros mais populosos de baixa renda tenham melhores condições de vida, pois ainda existem condições precaríssimas das vias e calçadas; do transporte coletivo; do atendimento de equipamentos de saúde, educação, assistência social, saneamento e lazer.  

Viçosa fica cada vez mais desigual, injusta, insustentável ambiental e economicamente. Os pontos aqui levantados indicam que há uma ineficiência de planejamento urbano adequado e equilibrado para todos, e descuidos com a gestão do território, problemas esses que se agravam continuamente. Da forma como está, estamos cada vez mais longe de uma justa distribuição dos benefícios e dos ônus decorrentes do processo de urbanização, como estabelecido no Estatuto da Cidade.


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